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30 de jan. de 2013

Tragédia de jovens choca mais porque é a idade certa de se morrer estupidamente

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- Santa Maria!
Nunca nos últimos tempos essa santa esteve tão em evidência. Centenas de jovens que morrem amontoados, pisoteados, asfixiados e queimados atraem as atenções dos "especialistas" de ocasião que acorrem para fazer análises superficiais e condenações precipitadas. No entanto, prefiro me ater a questões mais ontológicas.

Algum tempo antes da ocorrência da tragédia da Boate Kiss da cidade de Santa Maria, minha esposa desenvolvia nas suas aulas a tese de que os jovens atuais estão sofregamente sedentos por festas. Segundo ela, o corpo humano não tem estrutura suficiente para aguentar o repuxo de tantas baladas, por isso torna-se imperativa a recorrência massiva aos energéticos, álcool e aos mais variados tipos de drogas.

Os jovens vivem no período da vida caracterizado pela sensação de imortalidade onde tudo é permissível, possível, cabível e desfrutável, sem nenhuma preocupação com as consequências futuras. Por isso há uma idade certa de se morrer estupidamente e o trânsito nos faz lembrar o quanto essa lição é real.

Mesmo reconhecendo que os jovens apresentam tendências imanentes à autodestruição, a sociedade se choca profundamente quando os rebentos do seu futuro são ceifados às centenas ao mesmo tempo, no mesmo lugar. Alguns se perguntam, que anjos do Senhor lançaram com tanta indiferença o raio da morte sobre tantos jovens em pleno gozo das suas máximas capacidades físicas e mentais? Também me pergunto sobre os desígnios de Deus e só me ocorre a resposta de que eles são imperscrutáveis pela nossa vã filosofia.

Talvez essa tragédia sirva para que os pais reassumam um pouco o seu autêntico papel de refreadores de desejos. Todos sabem que é chato controlar, proibir, cercear, mas o jovem quando se vê entregue fatalmente à sua própria mercê, acaba agindo com a cabeça prevaricadora do diabo.

Talvez os pais tenham se tornado amigões e companheiros demais e educadores de menos, tudo para não se passarem por velhos rabugentos, assim como eles viam os seus próprios pais. Contudo, eles foram sobreviventes num mundo cão, enquanto seus filhos, usufruidores de todos os desejos e fantasias, talvez não tenham chance de ultrapassar a idade certa de se morrer estupidamente.

25 de jan. de 2013

Inseguranças da "segurança" das películas automotivas

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Quando trafegamos nas ruas sentimos que somos uma verdadeira mosca branca, isso porque o nosso carro jamais recebeu o batismo das famigeradas películas escurecedoras de vidros e não pretendemos jamais adotar essa modinha.

Contrariando o senso comum, já reverberei contra os inseguríssimos alarmes de carro e agora assumo mais essa polêmica na tentativa de demonstrar que nem sempre o que todo mundo prefere traz os melhores benefícios.

Ouço os argumentos de quem adora andar nas ruas no escurinho, mas agora vamos aos meus:
- dirigir à noite, no lusco-fusco ou em dias nublados é um verdadeiro porre, você praticamente perde a sua visão lateral e traseira, se é que você não é um daqueles idiotas que colocam película também no vidro dianteiro;

- se você esquecer a sua criança no carro, NINGUÉM passando nas redondezas descobrirá que algo de muito mal está se passando no interior daquele veículo. Por causa das malditas películas, vemos na imprensa casos de crianças esquecidas dentro de carros que morrem por asfixia, queimadura e desidratação;

- quando você sofre um sequestro relâmpago, o seu maior desejo no momento é que as pessoas olhem para dentro do seu carro e percebam que algo vai muito mal... se é que você não tapou os vidros do seu carro com os insidiosos insulfim negros como uma noite de lua nova. Nesse caso, diga adeus a qualquer ajuda externa e reze para que os bandidos sejam "bonzinhos";

- saiba que a sua visão lateral estará irremediavelmente comprometida pelas películas, portanto, é como alguém transformasse propositalmente o próprio veículo em tanque de guerra;

- a transparência natural dos vidros automotivos não chega a ser grande coisa. Se em cima disso você ainda cola um plástico com péssimas propriedades óticas, o resultado fica realmente terrível. Daqui a pouco, o Brasil terá que começar a liberar habilitações para cegos, que é o que estamos nos convertendo.

Se essas argumentações não lhe tocaram, desde as criancinhas mortas à cegueira voluntária, então você um daqueles motoristas que não querem de jeito nenhum que olhos indiscretos vasculhem o interior do seu veículo para que não descubram que você está falando no celular, enviando mensagens de texto, bebendo álcool, sem as mãos na direção e outras atitudes condenáveis. Então, realmente as películas foram criadas sob medida para a bandidagem da sua laia, porque essa mania começou entre os gangsters que não queriam ser incomodados pela polícia.

13 de jan. de 2013

Frases quentes sobre relacionamento

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O único homem que entende verdadeiramente as mulheres é o amante.

Portanto, não seja marido, seja amante, e olha que estamos falando de relacionamento mutualmente fiel.

Nenhum sacrifício em nome da beleza é suficientemente mortificante.

O traído é o último a saber, porque ele não sente cheiros, não ouve respirações, não interpreta gestos, não nota silêncios, não lê expressões faciais, não percebe mudanças de comportamento, etc. Logo, cornudos e cornudas são insensíveis indesculpáveis.

Amar é um ato desesperadoramente burro. Portanto, entregue-se incondicionalmente à burrice!

Vive-se só de amor? Não, mas também não se vive sem ele – os desamados sobrevivem.

Em se tratando de amor verdadeiro, a família é a pior conselheira.

Sim, se você acreditou um dia que conseguiu influenciar uma mulher numa tomada de decisão, você claramente é um idiota.

Mulheres adoram elogios, porém sem rasgação de seda e menos ainda ironias. Se você acha que elas não são perceptivas para essas coisas, busque a sua turma.

Tenha em mente que se para você o sexo é causa, para ela é consequência.

3 de jan. de 2013

A fabulosa técnica pianística Finger Tapping de Alberto Guerrero usada por Glenn Gould

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Todos que gostam das performances do pianista canadense e tiveram oportunidade de acompanhar os seus vídeos, sabem que o movimento dos seus dedos passa a ideia de perfeição de um mecanismo de relógio. O resultado prático da técnica adquirida pelo pianista é a extrema separação de vozes nas texturas polifônicas de Bach e outros e não é à toa que Glenn Gould passou para a história, antes de mais nada, pela sua gravação das Variações de Goldberg feitas em 1955, quando aos 22 anos já demonstrava um rigor formal absolutamente surpreendente (praticamente maquinal como exclamavam alguns).


Apesar de Glenn Gould vender a imagem de autodidata, isso não é verdade, pois dos 11 aos 20 anos ele teve aulas com o Pedagogo chileno Alberto Guerrero, que lhe ensinou a técnica desenvolvida por ele e denominada "finger tapping".
Vejamos aqui um relato que desmistifica a falácia:
In his mature years, Gould tended to give minimal credit to Guerrero, claiming that he was largely self-taught. He also insisted that he spent much less time practicing at the keyboard than studying scores away from it. With the following statement, Ray Dudley, another former Guerrero student, puts both these claims into doubt: "Glenn told me it took him 32 hours to tap out each variation of the Goldbergs prior to recording them the first time." Dudley is referring here to a slow exercise where the fingers of one hand are superimposed on the fingers of the other, tapping their way through a piece of music at the keyboard. This was a technique adapted to the piano by none other than Alberto Guerrero, and which, according to its practitioners, gives great clarity to rapid passagework, one of the most noteworthy aspects of Gould's almost miraculous dexterity at the keyboard. [Reviews of The Idea of Gould and The Art of Glenn Gould: Reflections of a Musical Genius]

Em português tapping  significa tamborilar, bater, ou seja o dedo indicador de uma mão aciona os dedos da outra simultaneamente ao movimento. Como a nota é tangida com o dedo em total relaxamento, a tecla volta à posição inicial passivamente.
O vídeo a seguir explica o conceito geral:


Dizem as lendas que Alberto Guerrero teve o insight do finger tapping depois que visitou um circo chinês e se maravilhou com um jovem contorcionista que fazia todo o tipo de movimentos complicados sem aparentar o mínimo esforço físico. Depois do espetáculo, ele foi aos bastidores e soube do treinador que a técnica consistia em "ensinar" as posições ao corpo do rapaz movendo os membros totalmente relaxados. Com isso, quando em cena, o artista repetia os mesmos movimentos partindo da sensação de repouso.

De acordo com os relatos, Glenn Gould repassou antes das gravações todas as 32 peças das Variações de Goldberg usando a técnica finger tapping, fato que consumiu 32 horas. [Wikipedia]
Procurando na internet, encontramos pouquíssimo material falando sobre a execução prática dessa técnica. Felizmente, no documentário Genius Within: The Inner Life of Glenn Gould há o depoimento da ex-colega de conservatório de Glenn Gould, a pianista e compositora Ruth Watson Henderson, que felizmente para nós, demonstra ao piano num pequeno trecho de Bach a técnica em ação!

Como todo remédio, esse também possui contra indicações. Se você notar, o repertório de Glenn Gould nunca abrangeu os compositores românticos, que segundo ele, eram afetados e histriônicos demais, que segundo ele, não sabiam compor, aliás, até sobre Beethoven ele alfinetava pesadas críticas. E a explicação para essa defecção é muito simples: peças do período romântico você toca com o corpo e Glenn Gould nunca aprendeu a tocar com o corpo.

O fato que ilustra emblematicamente essa deficiência ocorreu durante a apresentação em 1962 do concerto número 1 para piano de Brahms com a regência de Leonard Bernstein. Foi para a história a famosa declaração de Bernstein antes da apresentação desculpando a "interpretação não ortodoxa" do solista. E um dos motivos das saraivadas dos críticos, além do andamento extremamente lento, foi justamente a "barroconização" de Brahms, através da omissão deliberada das ressonâncias (uso orquestral do piano) típicas dos românticos. Mais um ponto para a falta de uso do corpo no ataque de música homofônica.
Confira nesse trecho:
In retrospect Bernstein must have been bothered by Gould’s other “departures” more than by the slow tempos. As Gould recalled in a radio interview in 1963, he was swept up with Baroque music at the time of the Brahms performance and trying to flesh out Baroque elements in Brahms. It is not the slowness that seems strange, or anti-Romantic, but the deliberate pulse, the detached articulation and the constricted range of dynamics. Brahms often wrote for the piano as if it were an orchestra. Here Gould tried to rid the piano part of orchestral thickness and purge the music of blatant expressive contrasts. [For Glenn Gould, Form Followed Fingers]

O outro senão ao uso exclusivo dos dedos no ato de tocar piano é que você tem que se posicionar extremamente baixo em relação ao instrumento. Isso justifica a estranha e arruinada cadeirinha (construída pelo pai) que Glenn Gould utilizava, cujo assento ficava a tão somente 33 centímetros do chão! Agora você entende porque Glenn Gould se tornou corcunda...

Ahh, o sacrossanto mandamento dos dedos arqueados também é negligenciado, pois se você prestar atenção no posicionamento das mãos de Glenn Gould, verá que a maior parte do tempo elas estão achatadas, muito disso devido à posição dos braços extremamente baixa em relação ao teclado.

Descrição da técnica Finger-Tapping no livro In Search of Alberto Guerrero