Quem ouve a sétima sinfonia de L.V.Beethoven não consegue deglutir
que o compositor das batidas insistentes, das repetições obsessivas, dos
contrastes violentos claro/escuro, tenha se descaracterizado ao ponto de escrever uma peça comportadinha feita sob medida para comercial lacrimoso de margarina.
Definitivamente não foi Beethoven que apôs à sua opus 27 nº
2 o qualificativo “ao luar”, claro que não, tal infâmia só teve oportunidade de
se insinuar após a sua morte. Para provar que a “richardclaydermanização*”
dessa sonata foi uma blasfêmia levada a cabo pela posteridade, resgato aqui
duas versões bastantes distintas, porém complementares.
Na primeira delas ouviremos a sonata como ela teria soado
aos ouvidos do Mestre, tocada num instrumento de época. Note como ela soa
soturna, seca e pouco afeita aos romantismos que foram contaminando-a ao longo
dos séculos vindouros. Aprecie a peça executada no temperamento histórico e experimente
algumas sensações novas, a exemplo deste comentário postado no vídeo: “a surprisingly nice tenor section and bass
though a little cloudy is fairly powerful. This must be a historical
temperament, most evident to me between tenor and treble sections”.
Agora, se você quer uma mondscheinsonate realmente lúgubre tocada num piano moderno, então prepare os seus ouvidos para o inusitado! Prepare-se para um adagio sostenuto que faz jus ao nome da palavra, em que cada arpejo escorre pesadamente destacado (gosto de pensar nesses arpejos assim, mais a la Philip Glass do que qualquer coisa, separados, frios e impessoais, do que um legatto tocante e meloso). Quando de repente irrompe a melodia sob a forma de vigorosas batidas de bigorna, aí você vê verdadeiramente Beethoven expressado com seus dilemas e contradições.
Aconselho vivamente que prepare seus ouvidos para a
estridência exacerbante do presto agitato,
o contraste lancinante que se ergue contra os arpejos lúgubres e fantasmagóricos ecoados
no primeiro movimento. Diga adeus ao pesadelo do Beethoven romântico!
* Pianista Richard Clayderman: notabilizado por seus
arranjos que transformam peças populares do repertório erudito de piano em musiquinhas
romantiquinhas de caixinha de música.
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