Comparado aos Steiways atuais, o piano da marca Pleyel
fabricado em 1848 é uma mimosidade frágil e escassamente sonora. No entanto, os
atletas bombadões atuais que esmurram Steinways de puro aço talvez tenham
esquecido e certamente matado a verdadeira herança musical de Chopin, que era
tímida, frágil e diáfana, tão contrastante aos fortíssimos brandidos em seu
nome nas salas de concerto, que em pouca coisa se diferenciam de arenas de touros
bravios, onde o ensurdecimento embrutecedor é o objetivo final... tão distante do
intimismo proporcionado pelas salas de câmara características dos tempos de
Chopin.
Por isso às vezes me pego na vontade de ouvir Chopin num
Pleyel, ou Ravel
e Debussy num
Erard da sua época, para tentar recriar o tempo em que a música além de não ser
barulho, se dava ao luxo de carrear um silêncio contagiante. Como estamos
rodeados de Steinways tonitruantes por todos os lados, de vez em quando um
pouco sutilidade e recato não podem fazer mal a ninguém.
No vídeo abaixo a insigne pianista canadense Janina
Fialkowska discorre sobre um Pleyel recentemente restaurado que resgata em
termos sonoros a sutileza há muito perdida.
1 – A madeira usada no gabinete é o Mogno cubano (Swietenia mahagoni), um tipo de madeira
raro hoje em dia e está em risco de extinção.
2 – A largura das teclas do Pleyel de Chopin era
sensivelmente mais estreita do que os pianos atuais. Portanto, quando você
observa o abuso de oitavas nas obras do Mestre, pode se dar conta o quanto ele com
sua mão pequenina tinha dificuldades bem menores do que as enfrentadas por você
no tecladão moderno.
3 – Enquanto o piano moderno tem 88 teclas, o piano de
Chopin possui apenas 83 teclas, por isso toda a sua obra nunca ultrapassou tais
limites.
4 – O curso da profundidade da tecla do Pleyel era 8 mm e o
piano moderno é de 10 mm. Isto implica em maior sensibilidade e facilitação das
passagens rápidas por um lado, e maior margem a erros por outro.
5 – Os pianos dos idos do século XIX tinham muito menos
metal do que os atuais. Isto significa que eles não tinham a chapa inteiramente
feita de ferro fundido, como as que equipam todos os pianos modernos, todos
herdeiros das modificações introduzidas pela família Steinway & Sons. Se
por um lado somos beneficiados pela maior estabilidade tonal e período de
afinação mais longo, nossos ouvidos recebem de troco o agressivo timbre
metálico característico dos pianos modernos.
6 – Conforme se nota no vídeo, o Pleyel de Chopin tinha
encordoamento reto. Ora, a preferência atual recai unanimemente sobre o sistema
de cordas cruzadas, que se permite cordas maiores, também é responsável pelo
desagradabilíssimo efeito dos “dois pianos em um”, quando você nota a quebra no
timbre no limite onde as cordas se cruzam. Dependendo da qualidade do projeto
de escala do instrumento, este efeito pode ser bastante desagradável.
7 – Os martelos projetados naquela época eram delgados e
delicados, pois não eram pensados para esmigalharem-se contra cordas dotadas de
capacidade para produzir barulhos suficientemente altissonantes para sonorizar auditórios
apinhados com milhares de ouvintes.
Eu tenho um piano Pleyel de cauda inteira de 1950 e posso afirmar que quando toco uma Polonesa,faço todos os fortissimo necessários sem problema. Também tive oportunidade de tocar num Pleyel de encordamento reto. Achei que a potência era boa, apesar da antiguidade, e não sugere essa fraqueza em que se supõe que Chopin pensava toda a sua música. De qualquer forma, o que sempre achei é que um Pleyel sempre permite maiores "nuances", e a resposta às intenções de toque são admiráveis. É uma pena que a marca não concorra como se merece no mundo. Contudo, há um problema: há pianistas que se queixam da perda de volume nos baixos com o tempo. Talvez aconteça com alguns modelos, não sei.
ResponderExcluirAcrescentando em outro ponto, há uma história - verdadeira ou não - que fala acerca de um pianista da época de Chopin (não me lembro do nome neste momento) que após uma execução da Polonesa Heróica foi muito aplaudido pelo público, mas pediu pessoalmente desculpas a Chopin, que estava presente, por ter tocado com tanta força, porém, disse ele mesmo, assim era como sentia a música. Parece que Chopin lhe respondeu: "Tomara que eu pudesse tocar assim, com essa força!"
Na minha opinião, coincido com a de vários pianistas que tentam derrubar aquela imagem delicada, às vezes quease feminina, de um Chopin fraco. As biografias sérias revelam episódios da sua vida que correspondem a um homem de carácter romântico, mas não precisamente "fraquinho". Esse "Chopinzinho" que faz deleite de um público que não seria correto chamar de "sensível" deveria desaparecer definitivamente.