3 de jun. de 2008
Um ano depois, homem é encontrado morto assistindo TV?
Não só morto, como também cego e diabético. O acontecimento surpreendente se deu em fevereiro de 2007, quando um homem de 70 anos foi encontrado sentado na frente da sua TV, parcialmente mumificado, já morto há um ano.
A bizarra circunstância aconteceu no bairro Hampton Bays de Nova York, quando os encanadores por força de um problema na tubulação hidráulica, tiveram que entrar no apartamento do sujeito, e se depararam com a cena inusitada da múmia morta sentada no sofá assistindo televisão há mais de um ano!
O surrealismo da situação se completa quando se sabe, pelos relatos da polícia que foi chamada ao local, que a televisão continuava ligada! A vizinhança se desculpa alegando que pensavam que ele havia se internado num hospital e a companhia elétrica não conseguiu explicar como continuou a fornecer energia, mesmo depois da suspensão do pagamento.
Este fato insólito serve perfeitamente como pano de fundo para se refletir sobre a radicalização do conceito de individualidade levado a cabo nos grandes centros urbanos mundiais. Aparentemente sob bons propósitos do “cada um que cuide do seu nariz”, os cidadãos urbanos se isolam cada vez mais. Uma pessoa que mora na Alemanha me confidenciou que ela no princípio se sentia estranha andando nas ruas, pois era como se fosse invisível. Segundo o seu ponto de vista isto acontece porque ela é estrangeira, mas a realidade e mais abrangente; os próprios nativos se ignoram entre eles mesmos, praticando religiosamente a política do mínimo contato.
O olhar, o sorriso, o abraço e o interesse pelo bem estar alheio parece ser um valor pré-histórico em extinção. Na sociedade de consumo, cada um luta para se isolar nos seus cubículos, para se dedicar de corpo e alma ao dispositivo eletrônico consolador de crianças e velhos: a TV, que mesmo representando uma pequena janela para o mundo, ao invés de trazer a libertação, pode ter sido a prisão mais eficiente inventada até hoje.
Se eu tivesse que escolher um símbolo para a pós-modernidade, entendida como a morte das metanarrativas, das universalizações e da dissolução do princípio do sujeito, não teria à mão imagem mais adequada do que o pequeno epitáfio da notícia acima: uma morte comum, tornada grandiloqüente pelo mais radical isolamento afetivo, um sujeito cuja memória foi resgatada somente no momento em que o seu cano de água estourou.
Fonte: Man Found Dead After One Year - Sitting in Front of TV
Pós-modernidade, sociedade de consumo, TV, metanarrativa, isolamento afetivo
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A falta de contato humano espontâneo é também um mecanismo de proteção do ser humano em resposta às tendências da época atual. Nunca se sabe se o sujeito ao qual você devota mesmo que uma ínfima parte da sua confiança vai usá-la contra você, então quanto menos contato, mais seguros estamos. Em teoria.
ResponderExcluirSimbolicamente, é como se todos nós estivéssemos construindo uma grande parede de tijolos brancos à nossa volta; e como Pink Floyd já nos mostrou, nem sempre isso é o melhor caminho...
O Roger Waters realmente criou uma bela imagem que sintetiza o estado de catatonia do homem pós-moderno. Com a desconstrução do sujeito e a queda das metanarrativas, o que sobra? Um polegar dedilhando loucamente no celular disparando torpedos, ou a reforma ortográfica que nada mais é do que a desconstrução da língua, ou tudo isso junto e mais um pouco? Todos desconstroem tudo e quem constrói alguma coisa? Este é o cheque pós-moderno batendo em todas as cabeças e no meio do tiroteio os cidadãos morrem sem ter deixado lembrança alguma...
ResponderExcluirUau, que loucura, mas por que o homem foi encontrado parcilmente mumificado? seria por medicamentos ou alimentos que ele ingeriu? Ou por algum fator do ambiente?
ResponderExcluirDevido à falta de humidade, por ele ter morrido no inverno. Nos países frios o procedimento comum é vedar todas as aberturas para evitar o escape do calor.
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