A cidade grega antiga, por formar uma totalidade orgânica aparentemente natural, imediata, realiza seu auto-reconhecimento por meio da obra de arte.
Ela realiza a sua maneira de conciliar os opostos do mesmo modo de conciliação que toda obra de arte opera. Uma obra de arte exprime a maneira grega de conciliar os opostos (dialética), exprime o espírito grego, pois ela opera uma conciliação sensível dos opostos: ela é indissociavelmente sensível e inteligível, é a união sensível, imediata, intuitiva do inteligível e do sensível, do divino e do humano, do uno e do múltiplo, do universal e do particular, da mesma maneira que a vida no seio da cidade grega se manifesta nos costumes e hábitos que constituem uma união indissolúvel, imediata, sensível, do universal (a lei) e das inclinações particulares dos indivíduos. Assim como a obra de arte não é a imitação de um modelo exteriormente imposto, também as maneiras de viver no âmbito da cidade grega não são reguladas por normas externamente impostas.
Assim como a parte sensível da obra está em seu próprio âmago como um dado essencial imediatamente aceito, também as oposições sensíveis ou “naturais” (cidadão-bárbaro, cidadão-mulher, cidadão-escravo) estão no âmago da cidade grega ou do mundo grego como dados essenciais imediatamente assumidos. Assim como a parte sensível da obra é imediatamente penetrada por um sentido, também os dados sensíveis ou “naturais” do mundo são espontaneamente animados por um universal.
O espírito grego, tal como se desenvolve objetivamente na cidade, se reconhece e se compreende na obra de arte, pois descobre nela a conciliação sensível que ele realiza tacitamente. Portanto, é precisamente por ser bela (por realizar uma conciliação sensível) que a cidade grega não deixa nenhum espaço para a liberdade individual, para a autonomia dos indivíduos, para a convicção pessoal, para a consciência moral, para o princípio da subjetividade e, portanto para a moralidade.
Fonte: Dicionário de Ética e Filosofia Moral, Canto-Sperber-Monique, São Leopoldo - Unisinos, 2003
Arte, Grécia, mundo sensível, dialética, conciliação dos opostos, sentido da obra de arte
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