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14 de mai. de 2008

A música cura o mal de Parkinson?


“Toda a doença é um problema musical; toda a cura é uma solução musical.”

Até começar a ler os livros de Oliver Sacks, a minha compreensão sobre o papel da música sobre o ser humano estava mais voltada para a contemplação estética do que para os seus insuspeitados efeitos clínicos. A musicoterapia pode passar a uma primeira vista a idéia de uma atividade realizada mais para promover um “relax” dos pacientes, do que, em alguns casos, como única forma possível de promover melhorias em quadros neuropatológicos graves.

Os casos clínicos relatados pelo Dr. Sacks no seu livro Alucinações Musicais remete diretamente à tragédia educacional brasileira. Ao longo de décadas de ditadura, os sucessivos governos militares dizimaram o ensino de música e o canto orfeônico nas escolas. Os militares foram para o Brasil os Exterminadores do Futuro, pois ao extirpar o ensino musical desde a infância, impediram que as gerações, à medida que vão avançando em idade, tenham um contato mais íntimo com os assuntos de música, uma vez que não encontram apoio no tesouro maravilhoso de antigas memórias do aprendizado de algum instrumento musical na fase infantil.

A tragédia brasileira se consuma na maneira como a faixa etária da terceira idade encara o aprendizado da música: algo destinado às crianças superdotadas e grandes intérpretes em potencial, nunca uma atividade essencial para manter o cérebro irrigado e em ótimo funcionamento. Pois posso afirma sem medo de errar, que a aprendizagem da música e o ato de tocar são a única atividade humana que provoca a plenitude de funcionamento dos dois hemisférios cerebrais, levando-os a uma harmonia absoluta. Aprender a toca piano, por exemplo, não desemboca necessariamente na carreira de concertista, mas para os velhos é tão vital quanto o exercício físico.

A simples audição da música clássica põe em funcionamento algumas zonas do cérebro que jamais se ativam durante a existência dos não apreciadores e não músicos. A execução de um instrumento por pacientes Parkinsonianos, senão os cura provoca neles instantes de pura magia, onde todos os sintomas desaparecem sob o ressurgir de um corpo dotado de movimentos harmônicos. O Dr. Sacks relata os seguintes casos:

“Testemunhei esse fato recentemente em um recital do eminente compositor e regente Lukas Foss, hoje parkinsoniano. Ele embarafustou pelo palco numa disparada quase incontrolável, mas assim que se sentou ao piano, pôs-se a tocar um noturno de Chopin com primoroso controle, timing e graça – e recaiu na festinação assim que a música terminou.

Esse poder da música foi inestimável para outro extraordinário paciente pós-encefalítico, cujos movimentos eram rápidos demais de lado direito do corpo e lentos demais do lado esquerdo. Não conseguimos descobrir nenhum modo adequado de medicá-lo, pois tudo o que melhorava um lado piorava o outro. Mas ele adorava música, e tinha um pequeno órgão em seu quarto. Com isso – e só com isso -, quando ele se sentava e tocava, conseguia usar as duas mãos harmonicamente e em sincronia.”

No Brasil, o mais famoso caso de parkinsoniano a se socorrer da música é o ator Paulo José, que usa o piano como terapia ao seu mal e lhe dá forças para conviver com o problema. Infelizmente o ensino exterminado pela mentalidade tecnicista dos militares não vislumbra a luz do fim do túnel, pois o pensamento tecnicista está voltando a seduzir os cérebros dos atuais gestores da educação em nosso país.

Referências: Livro de Oliver Sacks “Alucinações Musicais”.
Entrevista do ator Paulo José a revista Istoé
Fonte da Foto: http://images.inmagine.com/img/bananastock/bs092/goy068.jpg

Parkinson, terapia, música, ensino, canto, ensino de piano, musicoterapia, Oliver Sacks, Paulo José, ensino tecnicista

4 comentários:

  1. Genial. A música tem, com certeza, características que auxiliam na melhora da saúde neurológica. Nesse caso particular, acho que é válido fazer um paralelo com o fato conhecido de que os gagos também perdem sua deficiência quando cantam.

    Talvez não só a música, mas acho que o povo precisa de mais "alimento pro cérebro". Falta educação no meio de tanto pão e circo...

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  2. Sim, os gagos e os catatônicos que o Sacks cita. O caso de uma senhora em imobilidade hirta que somente se "desmineralizava" quando era instada a tocar algo no piano, bastava uma pessoa dizer o nome de uma música que ela sabia tocar de cor. Obrigado pela lembrança!

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  3. Eder Ricardo07/09/2009, 20:47

    Este artigo só vem confirmar o que tenho feito ultimamente. Sou professor de Educação Musical em uma Escola de Educação Especial na cidade de Bauru - SP. Há alguns meses fui convidado para trabalhar canto coral com um grupo de parkinsonianos. É um sucesso a cada aula, não só pela técnica aprendida, mas pela emoção em ensinar e a harmonia contagiante que recebo deles a cada música ensaiada. Sem contar os relatos ao término das aulas. Música é, sem dúvida, para todos. Felizmente os políticos estão "despertando" para que a cultura da educação musical volte às salas de aula, desenvolvendo o gosto pela música e pelo prazer de ensinar e aprender.
    Belíssimo artigo.

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  4. Infelizmente para este país, a ditadura militar desastrosa destruiu completamente os fundamentos da educação. O que eles levaram 30 anos para dizimar, talvez tenhamos que trabalhar sessenta para reconstruir e um dos pilares mais sagrados do processo educacional é a música, pois é imprescindível para a cognição em qualquer área que a criança vai atuar futuramente.
    Os sucessos no trabalho com os portadores de degeneração neurológica comprovam o quanto os militares explodiram uma bomba de nêutrons entre nós; mesmo preservando a nossa carcaça, eles destruiram o nosso futuro.

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